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04 maio 2011

Cegos se animam com o projeto do cão-guia

Governo estadual autoriza construção de centro de adestramento de cães na USP e alimenta expectativas
A possibilidade de contar com a ajuda de um cão-guia nas atividades cotidianas é algo que faz parte dos sonhos de grande parte dos deficientes visuais sorocabanos. Diante da dificuldade de acesso a esse benefício - já que existem enormes filas de espera para conseguir um cachorro treinado - a notícia de que o Governo do Estado de São Paulo iniciará a construção de um centro de referência para adestramento de cães-guia, que já está em fase de elaboração da licitação, aumentou as esperanças daqueles que não enxergam. "Com ele eu andaria mais despreocupado", admite Rogério Morales Rodrigues, de 63 anos, que há seis perdeu a visão. De acordo com a Associação Sorocabana de Atividades para Deficientes Visuais (Asac) não existe hoje, em Sorocaba, nenhum cão-guia sendo utilizado.


O Programa do Cão-Guia, do governo estadual por meio da Secretaria dos Direitos da Pessoa com Deficiência, prevê um investimento de R$ 2,5 milhões na construção de um prédio, nas dependências da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP (FMVZ), cujos profissionais atuarão na criação e treinamento de 30 cachorros por ano. Os filhotes, que devem ser doados por criadores, passarão o primeiro ano de vida com uma família voluntária para depois seguir para serem preparados para atender aos cegos, que os receberão gratuitamente.

Porém, ainda não foram estabelecidos os critérios para a seleção destas famílias e dos deficientes beneficiados. "Já existem listas de espera para os outros dois centros de treinamento existentes no Brasil, um em Brasília e outro em Santa Catarina", comentou Adriana dos Santos Publio, que ensina técnica de orientação e mobilidade para 43 alunos na Asac. Ela explica que este trabalho é essencial para que o cego saiba como se locomover por ambientes e pelas ruas com mais facilidade - com técnicas para atravessar a rua, andar pelas calçadas, entrar em comércios, pegar um ônibus, dentre outras - mesmo com o auxílio do cão-guia. "Muitos já chegam falando que querem ter o cão um dia e que não precisam destas aulas. Mas é o contrário. Antes de receber o cachorro estas pessoas precisam ser consideradas aptas na questão da mobilidade", contou Adriana.

A professora considera um importante avanço a criação do centro de treinamento no Estado de São Paulo e destaca que o ganho do uso do cão-guia para os deficientes visuais, ao invés da tradicional bengala branca, está na sensação de segurança. "O cachorro ajuda nesta questão da confiança, a evitar cair num buraco, ajudar a atravessar a rua. Mas é preciso que a pessoa tenha noção de mobilidade, saiba para que lado quer ir, onde quer chegar", comentou. "Eu gostaria muito de ter um, porque com certeza andaria por aí mais despreocupado. Isso sem contar que é muito bonito", opinou Rogério, referindo-se aos exemplares das raças Labrador e Golden Retrivier, comumente usados para os treinamentos.

Em Sorocaba, o vereador José Caldini Crespo (DEM) entregou ao coronel Vitor Maurício Gusmão Lopes, comandante do 7º Batalhão da Polícia Militar, um ofício pleiteando a instalação de um centro de adestramento de cães-guia no canil que está sendo construído na sede daquela unidade da Polícia Militar, no bairro do Cerrado. A assessoria de imprensa da Secretaria, entretanto, sinalizou que no momento não há projetos para expansão do programa para outras cidades.

O vice-diretor da Faculdade de Medicina Veterinária da USP, Enrico Lippi Ortolani, afirmou que a ideia de criar o núcleo partiu de duas alunas, que inclusive conheceram o trabalho desenvolvido em outros países. Ele acredita que o prédio estará pronto em dois anos e que a conclusão do adestramento dos primeiros cães ocorra um ano depois. No entanto, ele fez questão de afirmar que o núcleo na USP não será suficiente para atender a demanda, uma vez que treinará cerca de 30 cães por ano. Ortolani espera que o trabalho na unidade sirva de referência para outras entidades e governos, para que estes também criem o serviço. A faculdade da USP ficará responsável apenas pela pesquisa e adestramento dos cães, enquanto que a triagem dos deficientes que serão beneficiados ficará com o Estado.
 
Pouco acesso 
O Brasil possui cerca de 16 milhões de pessoas com deficiência visual, sendo que estima-se que 2,6 milhões estejam no Estado de São Paulo. O governo paulista não tem um levantamento de quantas se utilizam, atualmente, dos cães-guia. O que se sabe, entretanto, é que o número é baixo pela dificuldade de acesso e de manutenção do animal.

Segundo Adriana, não existe a possibilidade de comprar um cão-guia. "Todos que existem hoje, no Brasil, são doados". E quando algum deficiente chega à Asac com muita expectativa em relação ao cachorro, ela estimula o cadastro para a fila de espera, mas faz questão de explicar todas as dificuldades para se conseguir o benefício. "Os filhotes ficam um ano com uma família, depois são treinados por cerca de oito meses e destinados a alguém considerado apto a recebê-lo. Muitas coisas são consideradas: se a casa do deficiente é muito pequena, se a família gosta de cachorros, se tem alguém alérgico, se a pessoa já tem noção de mobilidade e muitos outros fatores". 
Celso Inácio dos Santos, de 33 anos, que já nasceu sem a visão, contou com orgulho que já teve a oportunidade de dar uma volta com a ajuda de um cão-guia, num evento na cidade de Itu. "Não é de tudo que conseguimos desviar com a bengala. Sou muito curioso e fui na direção da parede só para ver o que ele ia fazer. Ele não deixou". Tanta animação, entretanto, ainda não foi suficiente para fazê-lo se cadastrar nas filas de espera por um cachorro. "Tenho medo de pegar e não ter condições de mantê-lo, porque custa caro", comentou. 


Fonte: por Regina Helena Santos em Cruzeiro do Sul http://portal.cruzeirodosul.inf.br/acessarmateria.jsf?id=292998

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